- Evolução da Responsabilidade Civil do Estado:
A doutrina aponta como origem da responsabilidade
civil do Estado o caso denominado “Agnes Blanco”, é possível elencar pelo menos
cinco teorias:
a) Teoria da irresponsabilidade civil – anterior ao surgimento do
Estado liberal-burguês, defendia que o Estado não podia responder pelos seus
atos, o que restou sedimentada na célebre frase “o rei não erra” (the king
can do no wrong). É possível encontrar ainda hoje resquícios dessa
teoria em nosso ordenamento no tocante aos atos jurisdicionais e legislativos
(RE 505.393, do STF – info 473). Existem, contudo, duas exceções envolvendo ato
jurisdicional previstas no art. 5º, LXXV, CF: erro judiciário e prisão além do
tempo fixado na sentença (não confundi com a previsão do art. 133 do CPC).
b) Teoria da culpa civilista (atos de
gestão) – o
Estado só responde civilmente por atos de gestão (um aluguel de um prédio
particular, por exemplo), não respondendo por atos de império (uma
desapropriação, por exemplo).
c) Teoria da falta do serviço (culpa
do serviço, culpa anônima) – verifica-se responsabilidade civil do Estado
quando este falhar na prestação do serviço, seja por não prestá-lo seja por
prestá-lo inadequadamente ou de forma tardia, o que gera prejuízo ao
particular. Tal responsabilidade é subjetiva, exigindo a comprovação do dolo ou
culpa do Estado na omissão do serviço, e diz-se anônima porque não há necessidade
de se identificar o servidor faltoso para se imputar ao Estado a obrigação de
reparar o dano.
d) Teoria da responsabilidade civil objetiva com
fundamento no risco administrativo - significa que o Estado deve se
responsabilizar pelos atos comissivos cometidos pelos seus agentes que causem
danos aos particulares. Objetiva porque não se exige demonstração de dolo/culpa
do agente público. Essa teoria afasta a responsabilidade civil do Estado em
três situações: culpa exclusiva da vítima, caso fortuito ou força
maior e fato exclusivo de terceiro, hipóteses em que não se verifica
o nexo causal entre a conduta do Estado e o resultado danos.
Atenção para a denominada culpa corrente, que não
afasta, mas apenas mitiga a responsabilidade civil do Estado. É o chamado dano
em Bumerangue, a ensejar a compensação de culpas.
e) Responsabilidade civil objetiva com fundamento no
risco integral –Equipara
o Estado a um segurador universal, uma vez que a responsabilidade não fica
afastada sequer naquelas hipóteses que afastam o risco administrativo.
Reconhece-se em caso de dano nuclear, dano ambiental e atos terroristas.
Outros aspectos a serem abordados:
1. Denunciação à lide: Prevista no art. 70, III, do CPC,
tal instituto vem sendo objeto de discussão de duas correntes: uma primeira vem
a defender a sua aplicação, sob o argumento da economia processual (vide REsp
782834). Prevalece, porém, a doutrina que defende não caber denunciação da
lide, uma vez que isso significaria uma confusão processual ao misturar
reponsabilidade objetiva com responsabilidade subjetiva, bem como representaria
uma lesão ao princípio do contraditório e ampla defesa do Estado, uma vez que
ao denunciar o agente o Estado estaria reconhecendo sua própria culpa. É a
corrente a ser seguida (info 500, STJ).
2. Princípio da Dupla garantia: diverge doutrina e jurisprudência
acerca da possibilidade da vítima do dano poder acionar próprio agente público
que cometeu o dano. CABM, por exemplo, dá interpretação ampliativa ao art. 37,
§6º, que, segundo o autor se trata de uma norma que visa consagrar o princípio
da máxima efetividade das normas constitucionais. Na outra vertente, doutrina
minoritária sustenta o princípio da dupla garantia: uma primeira garantia
voltada pra própria vítima que só precisa demonstrar nexo e resultado; uma
segunda garantia é dada ao agente público que, segundo essa concepção, só pode
ser atingido em ação regressiva. Trata-se de interpretação restritiva ou
literal do art. 37, §6º, posição que vem sendo seguida pelo STF, que vem
afastando a chamada responsabilidade “per saltum”.
3. Responsabilidade Civil do Parecerista: Existem três espécies de
pareceres, já consagrados, inclusive pelo STF: parecer facultativo; parecer
obrigatório e não vinculante; e parecer obrigatório e vinculante. Apenas este
último gera responsabilidade civil do parecerista (vide art. 38 par. único da
Lei nº 8.666).
4. O que é causa para o Direito Administrativo a
ensejar a responsabilidade do Estado – Diferentemente do Direito Penal, que entende causa
como ação ou omissão, no Direito Administrativo entende-se que causa é apenas
ação, uma vez que a missão no Direito Administrativo não é causa para o
resultado, mas sim condição para este. A omissão não dá causa à
responsabilidade objetiva, mas sim subjetiva, devendo ser demonstrado o dolo ou
culpa do Estado (terceira corrente – falta do serviço, culpa do serviço ou
culpa anônima).
Exceções:
a) Omissão específica (info 502, STF) –
diferentemente da regra (omissão genérica), a omissão específica gera
responsabilidade objetiva quando, por exemplo, o Estado se omite de forma
latente em tomar providências para proteger mulher que vítima de violência
doméstica que efetuou diversos registros de ocorrência, sem contudo receber a
proteção do Estado, vindo a ser assassinada pelo seu companheiro.
b) Teoria do risco criado, gerado ou suscitado – existem algumas
atividades em que o Estado atua com um grau de risco acima da média, o que CABM
denomina de “guarda/custódia de coisas e pessoas perigosas”.
c) Trânsito (art. 1º, §3º, CTB)
– “
§ 3º Os órgãos e entidades componentes do Sistema Nacional de Trânsito respondem,
no âmbito das respectivas competências, objetivamente, por danos causados
aos cidadãos em virtude de ação, omissão ou erro na execução e manutenção de
programas, projetos e serviços que garantam o exercício do direito do trânsito
seguro.”
5. Quem são “terceiros” para efeitos de aplicação
da responsabilidade civil do Estado?
Uma primeira corrente sustenta que a palavra
“terceiros” deve ser empregada para aqueles que não tenham nenhum vínculo
jurídico com o Estado, nem estatutário (servidor, por exemplo) nem contratual
(um concessionário, por exemplo). Trata-se de uma posição pró-fazenda pública.
Foi esta a posição adotada pelo concurso da Polícia Civil do RJ, que
exemplificou com o caso de uma viatura de polícia que ao bater num poste, este
caiu e causou lesões na perna de um agente. Para tal corrente, a
responsabilidade civil decorrente do dano sofrido pelo agente não é objetiva, na
forma do art. 37, §6º, mas sim do Código Civil (art. 186). Também não haveria
se falar em responsabilidade objetiva no caso de a concessionária do serviço de
iluminação ter vínculo com o próprio Estado (se, por exemplo, a concessionária
manter contrato com a União, passa a ser considerada “terceiro”, hipótese a
ensejar a aplicação objetiva da responsabilidade.