Começo com a afirmação de que o diplomata brasileiro é muito bom,
mesmo na comparação direta com os diplomatas de outros países, incluindo
ou mesmo pondo em destaque os dos mais desenvolvidos. Isso não
quer dizer que seja o melhor do mundo nem que seu treinamento não
careça de melhoria, apenas que é de fato muito bom
1 . As razões são várias. Muito tem a ver com o forte sentido de intuição e improvisação que nós, brasileiros, desenvolvemos, em grande parte para compensar deficiência de educação formal, de treinamento de base e de profissionalismo, valores em geral pouco estimados, às vezes ainda hoje rotulados de ultrapassados, em alguns círculos. Sociólogos, antropólogos e outros cientistas sociais haverão de formular essa atitude de maneira mais sofisticada. Interessa-me, aqui, ir além e assinalar que, lado a lado com o que brota de espontâneo no diplomata brasileiro, alguns fatores específicos fazem a diferença em suas conforma- ção e atuação profissionais.O primeiro deles foi a herança legada pelo Barão do Rio Branco, o patrono da diplomacia brasileira. Nomes de reconhecida competência já estudaram sua obra
2 . Meu objetivo é ressaltar a autoridade que o Barãonos conferiu, ao ter conseguido, por meio de negociações diretas com as chancelarias dos países limítrofes ou do apelo a arbitragens internacionais, completar o traçado da fronteira terrestre do Brasil com seus 10 países vizinhos. Reduzir sua colossal biografia a essa conquista pode soar injusto, posto que até candidato a presidente da República o quiseram tornar, tamanha sua popularidade junto à opinião pública brasileira. Mas que maior contribuição poderia o Brasil prestar à estabilidade política da América do Sul do que acertar, de maneira pacífica, todas nossas fronteiras, ao longo de mais de 14 mil quilômetros de extensão? Pelo mundo afora, em nossa vizinhança ou em outros continentes, quantas guerras foram travadas, quantos momentos de tensão assustaram a comunidade internacional, no rastro de disputas territoriais em áreas de fronteira, tanto no passado remoto quanto recente? É, portanto, com credenciais muito claras que a diplomacia brasileira reclama autoridade para defender, no concerto de nações, o princípio da solução pacífica de controvérsias. O segundo fator, que termina por influir em todas as posições que adotamos, é o que somos como país. De modo sumário, aponto alguns tópicos em relação ao Brasil: • exibe história, valores e visão de mundo ocidentais; • situa-se na América Latina — lindeiro com 10 outros Estados, com os quais vive em paz há mais de 140 anos — e, ao lado da China e da Rússia, integra o grupo de países com o maior número de vizinhos terrestres; • faz a maior fronteira marítima com a África; • é multiétnico e miscigenado, vale dizer, as inúmeras etnias que compõem a brasilidade, desde o negro trazido escravo às mais recentes levas de imigrantes, foram integradas em uma sociedade plural, e muitas puderam manter, ao mesmo tempo, laços culturais e familiares com suas respectivas pátrias de origem
1 . As razões são várias. Muito tem a ver com o forte sentido de intuição e improvisação que nós, brasileiros, desenvolvemos, em grande parte para compensar deficiência de educação formal, de treinamento de base e de profissionalismo, valores em geral pouco estimados, às vezes ainda hoje rotulados de ultrapassados, em alguns círculos. Sociólogos, antropólogos e outros cientistas sociais haverão de formular essa atitude de maneira mais sofisticada. Interessa-me, aqui, ir além e assinalar que, lado a lado com o que brota de espontâneo no diplomata brasileiro, alguns fatores específicos fazem a diferença em suas conforma- ção e atuação profissionais.O primeiro deles foi a herança legada pelo Barão do Rio Branco, o patrono da diplomacia brasileira. Nomes de reconhecida competência já estudaram sua obra
2 . Meu objetivo é ressaltar a autoridade que o Barãonos conferiu, ao ter conseguido, por meio de negociações diretas com as chancelarias dos países limítrofes ou do apelo a arbitragens internacionais, completar o traçado da fronteira terrestre do Brasil com seus 10 países vizinhos. Reduzir sua colossal biografia a essa conquista pode soar injusto, posto que até candidato a presidente da República o quiseram tornar, tamanha sua popularidade junto à opinião pública brasileira. Mas que maior contribuição poderia o Brasil prestar à estabilidade política da América do Sul do que acertar, de maneira pacífica, todas nossas fronteiras, ao longo de mais de 14 mil quilômetros de extensão? Pelo mundo afora, em nossa vizinhança ou em outros continentes, quantas guerras foram travadas, quantos momentos de tensão assustaram a comunidade internacional, no rastro de disputas territoriais em áreas de fronteira, tanto no passado remoto quanto recente? É, portanto, com credenciais muito claras que a diplomacia brasileira reclama autoridade para defender, no concerto de nações, o princípio da solução pacífica de controvérsias. O segundo fator, que termina por influir em todas as posições que adotamos, é o que somos como país. De modo sumário, aponto alguns tópicos em relação ao Brasil: • exibe história, valores e visão de mundo ocidentais; • situa-se na América Latina — lindeiro com 10 outros Estados, com os quais vive em paz há mais de 140 anos — e, ao lado da China e da Rússia, integra o grupo de países com o maior número de vizinhos terrestres; • faz a maior fronteira marítima com a África; • é multiétnico e miscigenado, vale dizer, as inúmeras etnias que compõem a brasilidade, desde o negro trazido escravo às mais recentes levas de imigrantes, foram integradas em uma sociedade plural, e muitas puderam manter, ao mesmo tempo, laços culturais e familiares com suas respectivas pátrias de origem